QUIET RIOT
QUEBRA O JEJUM DOS METALEIROS
Sexta-feira, 26/4/85 - Já eram quase nove da noite quando chegamos ao ginásio do Corinthians, devidamente coalhado de PMs e seguranças contratados da Fonsecas Gang. A maioria da molecada aglomerada no portão trazia Eddie, a caveirinha do Iron Maiden, em suas camisetas pretas... e, o Quiet Riot nunca teve muita repercussão por estas bandas.
Lá dentro, Robertinho do Recife sobe ao palco com pontualidade britânica para desfilar as músicas do LP Metalmania. A acústica do ginásio não ajuda muito, o som chega todo embaralhado, mas milhares de gritos, urros e punhos erguidos dão vida ao refrão: "Bate o pé, bate a mão, a cabeça e o coração".
Na lanchonete, pausa para uma cerveja, ficamos sabendo que houve, à tardinha, uma considerável invasão para engrossar o público pagante. Versões de satisfação garantida - ou seja, Maiden, Judas Priest e Deep Purple - encerram a participação de Robertinho. "Num tô gostando do som do ginásio, não dá pra entender o cantor... tá ruim, declara Alemão, do alto de seus dezessete anos, encostado numa pilastra. O que é que eu disse?
Fim da preliminar. Rui, o homem da objetiva, se manda para o chiqueirinho dos fotógrafos, eu para o vestiário, a tempo de pegar Banalli, o baterista do Riot, saindo de cervejinha na mão para saudar o grupo de Robertinho. E quando fico sabendo das descabidas exigências da banda italoamericana. Por motivos "técnicos inexplicáveis, os outros grupos paulistas programados para esquentar a noitada - Made in Brazil - não tocariam mais. Nada poderia ofuscar o triunfo do Quiet Riot. Eu me pergunto... e Robertinho, teria ameaçado?
Quando passo de volta por baixo do palco, à caça de um lugar, Frank Banalli e colegas já estão em ação. Entusiasmo fogoso logo à frente do palco, e só.
De viseira vermelha, o vocalista Kevin Dubrow se exercita o tempo todo com seu especialíssimo pedestal para microfone, feito de madeira leve. As vezes, o empunha entre os dentes. Oubrigadou, San Páolo. Até que o som melhorou, em comparação com a preliminar.
Party All Night leva ao delírio generalizado, o caçula Kjell Benner substitui o recém-saído baixista Rudi Sarzo com sangue, suor e faíscas. Encerrada a musica, voam sobre o palco vários itens de vestuário, seguidos de uma faixa que agradece a visita da banda aos trópicos. Aos gritos, Kevin se enrola todo nela, erguendo o pedestal entre as pernas como se fosse vocês-sabem-o-quê.
Após rendições rasgadas de Dont Wanna Let You Go e Run For Cover é chegado o momento do obrigatório (pelo menos em shows heavy-metalúrgicos) solo de bateria. Banalli massacra tambores e pratos com as mãos, à moda do inesquecível John Bonham e, ao final, arremessa dois pares de baquetas para a platéia. Um dos felizes agraciados sobe nos ombros de um amigo e, a partir daí, vai reger a banda pelo show afora.
No palco, uma dobradinha de micagens entre kevin e o guitarrista Carlos Cavazzo, mas sem grandes comoções do lado de cá. Bem melhor é a entrada de Winners Take All, a única balada da noite e, talvez, seu ponto alto. Milhares de braços são levantados e sacudidos num ritmo dolente. Essa você já viu antes: todos os isqueiros da arquibancada estão acesos, enquanto o gelo seco não faz fumaça suficiente para cobrir o palco.
Não passou de um raro momento de romantismo. Com Lets Get Crazy a banda volta a seu andamento normal e, em seguida, Cavazzo fica sozinho no palco. Os outros, com certeza, foram se enxugar. Esperamos pelo solo de guitarra. Fundindo sua própria Battle Axe a Jesus, Alegria dos Homens de Bach, Cavazzo não mostrou grande coisa além de erudição exibicionista. Lembra de Randy Rhoads, aquele gigante da guitarra que começou com o Quiet Riot, para depois roubar os shows na banda de apoio de Ozzy Osbourne? Devia estar tremendo no túmulo.
Nas últimas frases do solo, os outros três voltam aos poucos, Kevin com um terninho de riscas verticais brancas e vermelhas. Lets Get Crazy é retomada em uma rápida emenda com Stomp Your Hands, Clap Your Feet, e o Riot faz uma saborosa citação ao hino máximo do rockabilly, Blue Suede Shoes, de Carl Perkins. Alguém ali no ginásio saberia quem é o ilustre rapaz? Quem reconhece a musiquinha incidental?
Todas as dúvidas se dissipam com o estrondo dos metaleiros reunidos na mais ruidosa unanimidade da noite. Afinal, estão tocando sua versão de Cum On Feel The Noize (aquela do Slade), o hit que estourou a banda em sua terra natal. Todo mundo está cantando, e Kevin aproveita para carregar Cavazzo nos ombros, no melhor estilo AC/DC ou Maiden. Quando a música termina, alguns gritos de Viva Brazil" e "Obrigadou e pronto, o Quiet Riot deixou o palco.
A gente sabe que eles vão voltar, não pelos fracos pedidos de bis, mas porque isso sempre acontece e faltavam ainda alguns sucessos. Dito e feito. E voltam acompanhados de uma bandeira do Corinthians. Vaia geral, pela apelação (aposto que, no Rio, atacaram de Flamengo). No palco, risos amarelos mas, tudo bem, atacam de Metal Health, com surpreendente marcação de Benner e um belo solo de Cavazzo. No público, aparecem até algumas daquelas máscaras de ferro que simbolizam o grupo.
Zumbido da overdose
Outro hit do Slade, Mama Weer All Crazee Now, conclui esta apoteose concentrada, e rebatida por um mar de mãos fazendo o característico sinal dos chifrinhos (que a rapaziada do Riot repudiou em sua entrevista coletiva: "Não temos nada de satanistas"). São 23h20 - o que dá uma hora e meia de show - e desta vez o adeus é para valer, acompanhado de acenos com a bandeira do Brasil. "Obrigadou, we love you. Ninguém pede outro bis, mal estamos saindo do ginásio e já dá para sentir aquele zumbido típico da overdose de decibéis. Alguns encontros, aproveito para uma troca de opiniões.
Peninha, o metaleiro cativo da FM 97, gostou "mas nem tanto". Já o venerável Celso Vechione, do Made in Brazil, achou "o cantor um palhação ridículo e desmunhecado". Para Jack Santiago, do grupo paulista Harppia, o Riot é apenas razoável, "bem pior que o Van Halen, por exemplo".
Enquanto isso, no restaurante que fica em cima do ginásio, prosseguia mais uma "Sensacional Sexta-Feira Dançante", com a Banda Mosqueteiros detonando boleros e sambas-canções. Será que dava para ouvir alguma coisa enquanto o Quiet Riot fazia seu serviço? Sei lá. A primeira coisa em que pensei foi em Athos, Porthos, Aramis e DArtagnan empunhando cavaquinho, violão, rabecão e clarinete.
Ficha técnica
Há mais de um ano excursionando pelo mundo, o Quiet Riot carrega pouquíssima aparelhagem, além dos instrumentos de cada músico. No Brasil, alugaram junto à empresa paulista Vai & Vai todo o PA (sistema de amplificação), a mesa de som, microfones e mesa de mixagem, fora caixas Fearl para a bateria de Banalli. A iluminação - 240 sopts de 1.000 watts e 4 canhões de luz Supertrouper - foi fornecida pela Translux.
Carlos Cavazzo trouxe três guitarras Gibson, nos modelos SG e Flying V, e duas caixas Mars Hall. Kjell Benner veio acompanhado de dois baixos Fender Frecision. Kevin Dubrow carrega de um país para o outro apenas seu exclusivo pedestal para microfone de madeira, enquanto a bateria Pearl de Frankie Banalli é complementada por pratos Zildjian e Paiste.: Completam o arsenal: racks de efeitos digitais NXR, distorcedor Zeus, equalizador gráfico e Noise Cate.
Calculava-se cerca de 4.000 watts de potência (lembrando que, nos anos 70, o Deep Purple se vangloriava de ser a banda mais alta do planeta, ao atingir os 10.000 watts).
Sexta-feira, 26/4/85 - Já eram quase nove da noite quando chegamos ao ginásio do Corinthians, devidamente coalhado de PMs e seguranças contratados da Fonsecas Gang. A maioria da molecada aglomerada no portão trazia Eddie, a caveirinha do Iron Maiden, em suas camisetas pretas... e, o Quiet Riot nunca teve muita repercussão por estas bandas.
Lá dentro, Robertinho do Recife sobe ao palco com pontualidade britânica para desfilar as músicas do LP Metalmania. A acústica do ginásio não ajuda muito, o som chega todo embaralhado, mas milhares de gritos, urros e punhos erguidos dão vida ao refrão: "Bate o pé, bate a mão, a cabeça e o coração".
Na lanchonete, pausa para uma cerveja, ficamos sabendo que houve, à tardinha, uma considerável invasão para engrossar o público pagante. Versões de satisfação garantida - ou seja, Maiden, Judas Priest e Deep Purple - encerram a participação de Robertinho. "Num tô gostando do som do ginásio, não dá pra entender o cantor... tá ruim, declara Alemão, do alto de seus dezessete anos, encostado numa pilastra. O que é que eu disse?
Fim da preliminar. Rui, o homem da objetiva, se manda para o chiqueirinho dos fotógrafos, eu para o vestiário, a tempo de pegar Banalli, o baterista do Riot, saindo de cervejinha na mão para saudar o grupo de Robertinho. E quando fico sabendo das descabidas exigências da banda italoamericana. Por motivos "técnicos inexplicáveis, os outros grupos paulistas programados para esquentar a noitada - Made in Brazil - não tocariam mais. Nada poderia ofuscar o triunfo do Quiet Riot. Eu me pergunto... e Robertinho, teria ameaçado?
Quando passo de volta por baixo do palco, à caça de um lugar, Frank Banalli e colegas já estão em ação. Entusiasmo fogoso logo à frente do palco, e só.
De viseira vermelha, o vocalista Kevin Dubrow se exercita o tempo todo com seu especialíssimo pedestal para microfone, feito de madeira leve. As vezes, o empunha entre os dentes. Oubrigadou, San Páolo. Até que o som melhorou, em comparação com a preliminar.
Party All Night leva ao delírio generalizado, o caçula Kjell Benner substitui o recém-saído baixista Rudi Sarzo com sangue, suor e faíscas. Encerrada a musica, voam sobre o palco vários itens de vestuário, seguidos de uma faixa que agradece a visita da banda aos trópicos. Aos gritos, Kevin se enrola todo nela, erguendo o pedestal entre as pernas como se fosse vocês-sabem-o-quê.
Após rendições rasgadas de Dont Wanna Let You Go e Run For Cover é chegado o momento do obrigatório (pelo menos em shows heavy-metalúrgicos) solo de bateria. Banalli massacra tambores e pratos com as mãos, à moda do inesquecível John Bonham e, ao final, arremessa dois pares de baquetas para a platéia. Um dos felizes agraciados sobe nos ombros de um amigo e, a partir daí, vai reger a banda pelo show afora.
No palco, uma dobradinha de micagens entre kevin e o guitarrista Carlos Cavazzo, mas sem grandes comoções do lado de cá. Bem melhor é a entrada de Winners Take All, a única balada da noite e, talvez, seu ponto alto. Milhares de braços são levantados e sacudidos num ritmo dolente. Essa você já viu antes: todos os isqueiros da arquibancada estão acesos, enquanto o gelo seco não faz fumaça suficiente para cobrir o palco.
Não passou de um raro momento de romantismo. Com Lets Get Crazy a banda volta a seu andamento normal e, em seguida, Cavazzo fica sozinho no palco. Os outros, com certeza, foram se enxugar. Esperamos pelo solo de guitarra. Fundindo sua própria Battle Axe a Jesus, Alegria dos Homens de Bach, Cavazzo não mostrou grande coisa além de erudição exibicionista. Lembra de Randy Rhoads, aquele gigante da guitarra que começou com o Quiet Riot, para depois roubar os shows na banda de apoio de Ozzy Osbourne? Devia estar tremendo no túmulo.
Nas últimas frases do solo, os outros três voltam aos poucos, Kevin com um terninho de riscas verticais brancas e vermelhas. Lets Get Crazy é retomada em uma rápida emenda com Stomp Your Hands, Clap Your Feet, e o Riot faz uma saborosa citação ao hino máximo do rockabilly, Blue Suede Shoes, de Carl Perkins. Alguém ali no ginásio saberia quem é o ilustre rapaz? Quem reconhece a musiquinha incidental?
Todas as dúvidas se dissipam com o estrondo dos metaleiros reunidos na mais ruidosa unanimidade da noite. Afinal, estão tocando sua versão de Cum On Feel The Noize (aquela do Slade), o hit que estourou a banda em sua terra natal. Todo mundo está cantando, e Kevin aproveita para carregar Cavazzo nos ombros, no melhor estilo AC/DC ou Maiden. Quando a música termina, alguns gritos de Viva Brazil" e "Obrigadou e pronto, o Quiet Riot deixou o palco.
A gente sabe que eles vão voltar, não pelos fracos pedidos de bis, mas porque isso sempre acontece e faltavam ainda alguns sucessos. Dito e feito. E voltam acompanhados de uma bandeira do Corinthians. Vaia geral, pela apelação (aposto que, no Rio, atacaram de Flamengo). No palco, risos amarelos mas, tudo bem, atacam de Metal Health, com surpreendente marcação de Benner e um belo solo de Cavazzo. No público, aparecem até algumas daquelas máscaras de ferro que simbolizam o grupo.
Zumbido da overdose
Outro hit do Slade, Mama Weer All Crazee Now, conclui esta apoteose concentrada, e rebatida por um mar de mãos fazendo o característico sinal dos chifrinhos (que a rapaziada do Riot repudiou em sua entrevista coletiva: "Não temos nada de satanistas"). São 23h20 - o que dá uma hora e meia de show - e desta vez o adeus é para valer, acompanhado de acenos com a bandeira do Brasil. "Obrigadou, we love you. Ninguém pede outro bis, mal estamos saindo do ginásio e já dá para sentir aquele zumbido típico da overdose de decibéis. Alguns encontros, aproveito para uma troca de opiniões.
Peninha, o metaleiro cativo da FM 97, gostou "mas nem tanto". Já o venerável Celso Vechione, do Made in Brazil, achou "o cantor um palhação ridículo e desmunhecado". Para Jack Santiago, do grupo paulista Harppia, o Riot é apenas razoável, "bem pior que o Van Halen, por exemplo".
Enquanto isso, no restaurante que fica em cima do ginásio, prosseguia mais uma "Sensacional Sexta-Feira Dançante", com a Banda Mosqueteiros detonando boleros e sambas-canções. Será que dava para ouvir alguma coisa enquanto o Quiet Riot fazia seu serviço? Sei lá. A primeira coisa em que pensei foi em Athos, Porthos, Aramis e DArtagnan empunhando cavaquinho, violão, rabecão e clarinete.
Ficha técnica
Há mais de um ano excursionando pelo mundo, o Quiet Riot carrega pouquíssima aparelhagem, além dos instrumentos de cada músico. No Brasil, alugaram junto à empresa paulista Vai & Vai todo o PA (sistema de amplificação), a mesa de som, microfones e mesa de mixagem, fora caixas Fearl para a bateria de Banalli. A iluminação - 240 sopts de 1.000 watts e 4 canhões de luz Supertrouper - foi fornecida pela Translux.
Carlos Cavazzo trouxe três guitarras Gibson, nos modelos SG e Flying V, e duas caixas Mars Hall. Kjell Benner veio acompanhado de dois baixos Fender Frecision. Kevin Dubrow carrega de um país para o outro apenas seu exclusivo pedestal para microfone de madeira, enquanto a bateria Pearl de Frankie Banalli é complementada por pratos Zildjian e Paiste.: Completam o arsenal: racks de efeitos digitais NXR, distorcedor Zeus, equalizador gráfico e Noise Cate.
Calculava-se cerca de 4.000 watts de potência (lembrando que, nos anos 70, o Deep Purple se vangloriava de ser a banda mais alta do planeta, ao atingir os 10.000 watts).
Eu falo que nasci na época errada....quem me dera assistir um show, mesmo que meia boca, do Quiet Riot
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