quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Bizz número 1 - Porão (bandas que ainda não tocam no rádio)

REM

    Em sua terra natal, os americanos do R.E.M. são, já há alguns anos, incondicionais queridinhos da crítica. Na Europa, então, a adoração se estende a, um pequeno mas fanático séquito. E a tribo que os coloca, junto com os grupos Jason & the Scorchers, Violent Femmes, Dream Syndicate e Gun Club numa espécie de renascença do verdadeiro rock ianque. Um rock rústico, ruidoso e original.
    Formado em 1980 por Peter Buck (guitarra), Michael Stipe (vocal), Mike Mills (baixo) e Bill Berry (bateria), o R.E.M. pôs no mapa musical o nome de Atlanta, capital da Geórgia. Com várias gravações superpostas de Buck, ora na guitarra, ora no violão, o primeiro compacto era uma produção independente com Radio Free Europe e Sitting Still. Não deu outra: melhor do ano (81), segundo os críticos da Rolling Stone. A mesma turma de escribas que elegeria Murmur, o LP de estréia, melhor de 83.
    No confronto direto com o público não foi tão fácil. Os fregueses de um bar, no Texas, pagaram à banda 500 dólares para ela não tocar. Num show para a Força Aérea americana, tiveram de sair do palco sob proteção policial, tomates voadores e gritos de ´bicha!". Doce calvário dos inovadores.
    R.E.M. é um termo médico que abrevia rapid eye movement (rápid movimento ocular) e designa a etapa do sono em que mergulhamos em sonhos. Sintonia direta com as letra enigmáticas, quase obscuras, que povoam um universo sonoro compara do a dois marcos do rock feito à base da fusão guitarra/violão, os Byrds e Velvet Underground.
    No palco, essa textura se espalhem trancos e barrancos de liberdade irreverência. E capaz que o R.E.M seja a última banda do planeta a aceitar pedidos da platéia.

JESUS AND MARY CHAIN

    Quando você ouvir - e ouvir falai de - Jesus and Mary Chain, pense em desintegração. São quatro garotos de Glasgow, Escócia, um belo buraco onde não existe nada para a garotada, a não ser um bate-bola e um porre constante. William Reid (guitarra), Jim Reid (vocal), Douglas Hart (baixo) e Bobby Gillespie (bateria) têm menos de vinte anos. Formaram a banda há menos de um ano. Nesse tempo, saíram da monotonia caseira, estabeleceram-se em Londres - morando três em um quarto -, lançaram um compacto (Upside Down) pelo selo ultra-independente Creation, lançaram outro compacto (Never Understand) pelo selo menos independente Blanco Y Negro (associado à WEA), que penetrou nas paradas inglesas, e logo passaram a ser qualificados de "Sex Pistols dos anos 80". Qual é o mistério?
    Desintegração. Uma batida psicótica. Uma melodia pop que se arrasta como um dinossauro ferido. E ondas e ondas de microfonia. Para eles, a microfonia não é apenas um truque no final de um acorde, usado para excitar o ouvinte. É a própria essência de seu som. Hendrix adoraria.
    Não existe tonalidade. Não existem os crescendos que atingem aqueles piques dançantes e assobiáveis próprios ao pop. Temos microfonia rasgando o ouvido como uma lima, e a guitarra arranhada a ponto de soltar faíscas. Eu os ouvi pela primeira vez em uma fita pirata de uni vendedor em Portobello Road, em Londres. Disse ele: "O concerto é assim mesmo. Quarenta minutos de microfonia. E quando eles resolvem ir embora, param e saem no meio de uma música".
    Apareceram em um "vídeo", digamos assim, na BBC. Camisas soltas, caras de bebê, branquinhos, jeans rasgados no joelho. Um estilo de neopsicodelismo. Mas eles não estão preocupados com modas.
    A Corrente de Jesus e Maria. A ambivalência de fundo religioso não fica só no nome. Em nome do pai do rock - Elvis - do Filho - os malucos e degenerados do som dos anos 60 - e do Espírito Santo - a geração punk -, esta corrente diz "Amém".
    Este seria o som do incesto de Jesus e Maria. Cortante, estilhaçador, um diamante bruto rasgando o vidro. Por tudo que evita, por todos os sons que não respeita, por todos os silêncios aos quais não se submete, a "música" de Jesus and Mary Chaín é uma das soluções possíveis para a música pop.
    A indústria do pop é mais voraz do que qualquer monstro mitológico. Precisa de um mito a cada dia. Na indústria, existe uma grande expectativa em tomo desses escoceses. Eles serão capazes de gravar um LP? A WEA vai apostar no seu sucesso? Eles são capazes de levar gente a seus concertos? Tudo isso é secundário. Jesus and Mary Chain já cumpriram sua função transgressiva. Se voltarem ao silêncio, será um grande e apropriado final.


BIQUINI CAVADÃO

    Se numa das tardes preguiçosas de outono você tiver esbarrado no rádio com um grupo chamado Biquini Cavadão, das duas uma: ou você jogou longe a caixa de chocolates e tratou de aumentar o volume aos berros de "que negócio é este!?" ou você correu ao telefone para marcar uma consulta urgente com o otorrinolaringologista, certo de estar sendo vítima de um caso agudo de alucinação aural.
    Nenhuma das alternativas acima. O Biquini não é piada, nem alucinação, apenas um dos quintetos mais afiados que surgiram na cena carioca nos últimos meses. Misturando teclados tecnomultitexturizados, harmonias pop remanescentes dos Beatles e letras incisivas, o Biquini é um rockshake peculiar, resultado da dieta musical ultra-eclética a que foram submetidos Bruno (vocais), Sheik (baixo), Miguel (teclados), Alvaro (bateria) e Luis Carlos (guitarra). Nutridos de muito samba, música clássica, Roberto Carlos, tecnopop inglês e alemão e bandas da nova geração de rock brasileiro, o Biquini forjou uma sonoridade única.
    Há dois anos o Biquini Cavadão não era o Biquini Cavadão. "A gente ficava debruçado no dicionário", lembra Bruno, "tentando achar nomes diferentes e acabava não achando nada de bom. O grupo quase se chamou Hipopótamus de Kart, ou, então, Lambrodocidus Angelibarba (o nome de um peixinho abissal), até que um amigo (iniciais:H.V.), vendo aquela confusão toda, disse: ´Ah, põe Biquini Cavadão e acabou o assunto´. E ficou sendo Biquini Cavadão. Eu fui contra, achava bobo, mas todo mundo gostava e acabei gostando também."
    "Tédio", compacto de estréia, é uma bela crítica ao marasmo das jornadas escolares e um claro flagra do estado de espírito do estudante, em particular, e do jovem, em geral. Parafraseando Herbert Vianna, que emprestou guitarras e idéias à gravação de "Tédio", atrás do bom humor do Biquini tem uma seriedade legal.

CAPITAL INICIAL

    "A Europa tá um tédio, vamos transar com estilo. Nós só temos um remédio, descendo o Rio Nilo." E um trecho de "Descendo o Rio Nilo", música do Capital Inicial, primeira banda, depois do Legião Urbana, a sair do Distrito Federal para uma carreira nacional. E Brasília, também está um tédio? "Tá, tudo tá", acha o vocalista Dinho.
    Qual o remédio? No final dos anos 70, um grupo de amigos apaixonados pelo punk inglês resolveu fazer alguma coisa" em Brasília e colocou em prática o lema Do it Yourself (em português, Faça você mesmo). Saiu tocando pelas ruas da cidade.
    O movimento punk inspirou várias bandas brasilienses, mas o Capital foi a primeira a deixar a cidade. Está em São Paulo há seis meses.
    O primeiro show da formação atual da banda foi em julho de 83 na UnB. Dias depois estavam no Rio, junto com o Legião Urbana, abrindo para Lobão. Na semana seguinte tocavam no Sesc Pompéia, em São Paulo.
    Em 84 o grupo tinha duas fitas de demonstração (demo) na Fluminense-FM de Niterói. A CBS ouviu, incluiu o grupo na coletânea Os Intocáveis e lançou o compacto.
    O grupo pensa num LP ainda para este ano. Até lá, a meta é fazer shows, cuidar do repertório e "ganhar experiência", diz o baixista Flávio.
    "Formamos a banda sem saber tocar", lembra o guitarrista Louro. ´Mas compensamos com sangue", emenda o baterista Fê.

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