sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Bizz número 2 - Lançamentos II

MIRROR MOVES - Psychedelic Furs (CBS)
    Contemporâneos do levante neopsicodélico inglês de 79, os Furs - os irmãos Richard (vocal, letras) e Tim Butler (baixo), mais o guitarrista Tony Ashton - foram progressivamente aparando as farpas punk de seu climático coquetel sonoro. Mirror Moves, apesar de o primeiro a ser lançado aqui, é já o quarto LP da banda. Até o anterior(83), eles gozavam apenas do respeito da crítica conterrânea. Aí estouraram na América, via MTV, com o clip para "Love My Way" e até moram na terra de Tio Sam. Pela pasteurizada produção de Mirror Moves, dá para sacar no ato.

    DREAM OF A LIFETIME - Marvin Gaye (CBS)
    Ponto pacífico: Marvin Gaye foi um gênio. Cantor e compositor de toque inconfundível e inimitável, multiinstrumentista e arranjador, entrou na década de 70 com técnicas revolucionárias de produção em estúdio. Resumindo: uma perda do nível de Buddy Holly, Jim Morrison, John Lennon etc.
    Este disco póstumo reúne de um lado o material já preparado para o sucessor à obra-prima Midnight Love (82). Do outro lado, faixas que ficaram fora desse último por serem consideradas, pela gravadora, ofensivas aos "bons costumes". (Lembrando que Midnight Love foi concebido como uma espécie de tratado sexológico dançante.) Preciosidades: "Masochistic Baby" (com os versos "eu adoro o seu corpinho/ por isso é meu dever/ espancar o seu corpinho") e "Sanctified Lady" - cujo título original era "Sanctified Pussy" (algo como "gatinha abençoada", sendo que em inglês gatinha responde pela parte, e não pelo todo). Um toque aos tradutores da CBS brasileira: "Savage in the Sack" quer dizer "Selvagem na Cama", não no saque!

    ANTIMALDITO - Jorge Mautner (Polygram)
    Esse esganiçado menestrel punk-naif e seus violino e bandolim já cometeram obras-primas indiscutíveis como "O Vampiro" e "Maracatu Atômico". Por essas e outras, a reaparição de Mautner e seu inseparável guitarrista Jacobina é tão oportuna no Brasil 85. Idiossincráticas, logo geniais, ou vice-versa, não importa: quantos fazem letras assim?
    Com produção de Caetano Veloso para o selo Nova República (!), Antimaldito tem muito mais a ver que o esforço anterior - um LP cheio de "estrelas" como Zé Ramalho e pouquíssimo Mautner. As faixas "Cachorro Louco", "Zona Fantasma" e "O Tataraneto do Inseto" são minha MPB do ano. E vale lembrar que há pouco a Baratos Afins reeditou a sublime/despojada estréia de Mautner, Para Iluminar a Cidade (72).

    TODAS - Marina (Polygram)
    Essa voz de angorá manhosa ainda consegue transformar material mediano e letras "eu te amo" em discos de cabeceira para sua legião de fãs. Mas dêem a ela melodias mais pegajosas e menos lineares que o tal batalhão pode crescer em progressão geométrica. Uma boa prova está em "Doida de Rachar", uma das faixas de Todas em que ela e seu parceiro Antônio Cícero arriscam traduzir um original do ex-Steely Dan, chamado Donald Fagen. Dobrando todos os backing, ela mesma, Marina faz o som virar veludo. O que raramente acontece no resto do disco, ressentido ainda da troca da produção agressiva e encorpada de Fullgás (o LP anterior) por outra bem mais... careta.

    VARÈSE - Robert Craft e membros da Orquestra Sinfônica Columbia (CBS)
    "Sei voar com minhas próprias asas", respondeu ele secamente, uma vez, ao lhe perguntarem quais tinham sido as influências que sofrera. E, de fato, as posições estéticas e os processos de escrita de Edgar Varèse (1885-1965) são tão pessoais, que o separam de seus contemporâneos, como uma das figuras mais originais na música do século XX.
    Talvez o primeiro a romper com os conceitos tradicionais de desenvolvimento e de variação como os processos básicos para a estruturação da peça musical, Varèse concebe os sons como verdadeiros objetos, formando planos e volumes que são mantidos coesos pela energia do ritmo. Seu abandono da noção convencional de melodia e harmonia e seu uso agressivo de percussões ou de recursos eletrônicos vão influenciar experimentalistas como Stockhausen ou John Cage e, na área popular, músicos como Frank Zappa ou o nosso Arrigo Barnabé.
    Um panorama bem abrangente de sua obra - Ionização, Densidade 21.5, Integrais, Octaedro, Hiperprisma e Poema Eletrônico - está neste recém-lançado volume da coleção CBS Masterworks.
    Lauro Machado Coelho
VU - The Velvet Underground (Polygram)
    Ouça este disco bem alto e tente adivinhar quando as músicas foram gravadas. 77? 80? 86? Resposta: entre fevereiro de 68 e setembro de 69. Para quem não sabe, o Velvet de Lou Reed e John Cale é - ao lado dos Doors - o grupo mais influente da década de 60. Uma ilha de sombrias crônicas do submundo e de cinismo cercada de todos os lados pelo florido espírito da era hippie. As influências posteriores estão nítidas, de Bowie e Byrne (década de 70), até Sisters of Mercy, Smiths e Joy Division (década de 80). Este último deixou registrada uma acachapante versão ao vivo de "Sister Ray
    A história desse disco é a seguinte: quando preparava-se, no começo do ano passado, para relançar os primeiros três LPs do Velvet, o selo Verve encontrou arquivadas fitas para um "quarto" LP que nunca existiu por essa gravadora (haveria ainda mais dois, ambos ao vivo). Remixadas com a tecnologia atual, resultaram no melhor LP lançado aqui este ano.
    Músicas como "I Can´t Stand It" e "Andy´s Chest" seriam regravadas mais tarde por Lou Reed em sua carreira solo. Outras como "Lisa Says" e "Ocean" apareceriam nos discos "seguintes" do Velvet. lnútil tentar qualquer blá-blá-blá em cima: isto é História, crianças. E os Reedófilos inveterados vão se deliciar ao reconhecer em "Stephanie Says" o embrião de "Caroline Says", uma das mais afiadas giletes de seu principal LP, Berlin (74). Triste mesmo é a Polygram não ter traduzido o excelente texto/histórico de Kurt Loder, encartado em VU.

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